domingo, 20 de março de 2011

MELÔ DO DINHEIRO

Oh Dinheiro
Vou abordar a vida
E quero que você seja minha compainha
Grana, grana
Seja cúmplice na trama
Seja meu dono, seja minha dama
Rainha dos vícios
Lícitos e ilícitos

Dinheiro permita-me viver e deixar morrer
Permita-me uma morte com pompa e circunstância
Após uma vida de excesso e indulgência
Dinheiro permita-me ser mais experimental do que abstrato
Mais pragmático que teórico
Mais adaptado que redigindo manifestos
Me dê o direito de quebrar a cara de verdade e me desiludir
Com vivências intensas em vez de voos na rotina
Dinheiro deixe minha garota ir embora pois estou sentado no topo do mundo
Permita que sem burocracia eu diga orgulhoso I don't care, je ne regrette rien

Ô saco
essa vida de migalhas
sapos, aventuras vãs
Mergulhos efêmeros
despojadas esperanças, irmãs da descrença
expectativas noturnas de cara limpa
sem nicotina
sem beijo na boca
Resistindo teimoso até madrugada
sem carona esperando meu Mercedes lotado
com pivetes me encarando do outro lado da rua
desejo de ir
ao show
de dar um show
Do lado de fora eu escuto e é gol, gol
Um lugar apertado na arquibancada ou geral
Teatro dos resignados, contraindo um efeito moral
Lendo sobre a vida que passa no jornal
A TV como entidade maior de comunhão
Chorando desconto, catando moedas no chão
Ah vida loka
repleta de possibilidades impossíveis
Sonhos, vertigens,
cheios de limite, sem convite
Loucuras sem patrocínio
Devaneios sem abrigo
Quero ter direito à monumental ressaca
Eu também quero gozar
Eu também quero Mick Jagger
Eu também quero Iggy Pop
Eu também quero santos ídolos do excesso que beijaram a morte aos 27
Oh lua cheia
de merda, mais uma vez sua luz me ilude ilesa
Eu também quero viajar para todos os sentidos
Eu também quero me chapar e não ficar enrustido
Eu também quero desfilar com roupas desleixadamente caras
num carro vintage ao som de um dinossauro do rock
que em vez da poluição do fake carioca
toque o submarino amarelo
nas ruas que transbordam seu apelo
Me deixe ficar alto dando uma volta sábado
Por essas esquinas que abrigam especulação sexual, euforia e demandas reprimidas
Quero em vez de roupas usadas do meu irmão mais velho,
trajes sob medida, customizados, da grife que leva meu nome
Eu também quero me vender
Quero ser um produto
Oh droga
de não possuir droga nenhuma
Oh Dinheiro
Dê um jeito no meu cabelo que cai
Infla de músculos meu corpo esquálido
Me dê um olho de cada cor
Me faça até andar diferente
Já chamei meus amigos pra festa
Disseram que estão sem dinheiro
Empolguei demais, quanto deu a conta?
Vamos rachar mas intera a minha grana
Oh Dinheiro
Legitime meu direito
de ir e vir
Pode ser de Nova York a Nova Délhi
Ou só pra ir de carro até a esquina
Oh Dinheiro
Não é por um minúsculo voto e um direito de expressão sem mídia
Que uma cidadania é plena
Um cidadão só é um pleno cidadão enquanto consumidor
Faça-me importante para o sistema
Sentado sem fazer nada à beira da praia
Mas circulando a moeda, incentivando no mercado a oferta
A principal função social não é trabalhar, é consumir
E eu que dou duro pra ganhar um salário de miséria,
Valho menos que um vagabundo com nota
Oh Dinheiro
Nunca ganhei de você um tapinha nas costas
Que te fiz de mal?
Por que não nos encaramos olhos nos olhos?
Façamos um trato
Eu te juro ser aliado da grã-ordem capitalista
E você autentica minha complacência
Juntos iremos combater o desemprego
Com um empregado para cada capricho
Faça-me sentir um rock star
Torne real meu alter ego
Ponha-me na coluna social
Faça-me irreconhecível pra mim mesmo
Oh Karma
Oh Dharma
Oh Dinheiro
Onde estás que não me ouve?
Quer me converter
num ateu
num socialista
num anarquista
num beat
num hippie
num punk
num terrorista?
Num funcionário público com estabilidade?
Quer me converter num ladrão
Num operário padrão
Num suicida com um bilhete escrito loser?
Oh Dinheiro
Minha arma está carregada
Minha alma tem ressentimento
Meu espírito sente inveja
Odeio celebridades porque não compartilhamos do mesmo karma
Nem tenho um mísero papel nesse teatro de vampiros
Oh Dinheiro
Você é o maior afrodisíaco
Com você não passo as noites sozinho - na cama
E nem me importo em ser amado pela grana
Dinheiro
Seja a minha religião pagã
Meu fantasma trafega sem fé
E o paraíso é mais embaixo
Converta a desgraça
em alguma forma
de graça
DE GRAÇA


SKELTER - 20 março 2011

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