quinta-feira, 10 de março de 2011

UTOPIA (QUERO OS JOVENS NAS RUAS)

Quero novamente os jovens nas praças
Oferecendo flores aos guardas
Quero novamente os jovens nas ruas
A memória do avesso do avesso nua
Que delicada celebra pequenos feitos
E não se cala diante de censuras caducas

Meninos nascendo da orgia 
Feita na chuva e lama de um consagrado festival
Um Woodstock sem fim nem começo

Roupas coloridas místicas
Compondo o carnaval de infinitos estilos

Queimar num mutirão sutiãs e roupas íntimas 
De um passado vergonhoso e moralista

Recitar o poema que abençoa a violência do coração 
Contra o que é deveras sólido e grave

Banhar no rio em que nos esquecemos do nomes
Para reaprender o que somos 
Ao sabor do vento e das flores
Pintando o quadro da vida e do amor
Em um êxtase sem pressa e duradouro

Assassinar o relógio que repousa no coração do mundo
Um ato terrorista contra o relógio que monta guarda na superfície do meu rio
Que corre infinito por vias
Rotas alteradas
De cardumes de amor, de espasmos

E ano a ano celebrar uma festa ao pé do túmulo da saudade

Quero abençoar o casamento da luz com a poeira
Da beatitude e do efêmero

Dançar pra afastar as nuvens 
Que carregam o sangue dos antepassados 
Mortos em batalhas sem razão
Feitas do cumprimento de missões estéreis, 
Religiões caducas
Moral do trabalho sem coração
Violar a academia com o perfume jovem
Inocentar os escorpiões e serpentes
Tragar a fumaça de ondas místicas
Do contato direto com Deus pela Arte & Natureza

Moralismo e consumismo
Um dia banidos da graça onipresente da dança
Não viver pelo dever
Nem o dever de ser feliz
Ser triste se quiser
Mas ser sobretudo autêntico e amoroso

Ser uma ponte para o mundo em que toda criança tem um reino
E o homem se orgulhe de ser descendente de uma árvore

O novo educa o velho
Tem sido desde o fim esse princípio
Sede de viver, de criar e renascer
Reconstruir das ruínas de um mundo caduco
Uma aldeia sem fronteiras e países

O nobre cubra de cinzas o altar do progresso insustentável
O homem ore para o Deus subversivo
Que mora nas montanhas altas como a coragem de um falcão
Que mora nas fontes de água límpida como a mente aberta

E o homem distancie-se das orações ao deus moralista
Que mora no amor ao temor,
Na conversão do íntimo a pecado 
E do prazer a constrangimento

Minha revolução não se compactua com o eterno Amanhã
Nem da Ordem, do Progresso nem do Paraíso Celestial

Minha política não se projeta com sangue, suor e lágrimas
Que de lutas inflamadas por slogans
Estamos devorados
De lutas orquestradas por partidos e corações ressentidos
Estaremos fadados a uma loucura estéril

Não há perda em amar e criar laços no instante
O Aqui-Agora é morada da grande e única mudança

Individual é a mudança, repercutida no coletivo

A espontaneidade e o amor ditam a obra

Ecologia e poesia na ordem do dia

A educação flui do afetivo para abraçar conexões complexas
Matemáticas, tecnologias de baixo custo
Banquetes anarquistas filosóficos, estéticos
Arautos de uma gaia ciência

Que não lesa a natureza
Divina como um pote de mel
Dialética como um vento na curva da estrada

Como círculo que se expande na água 
Quando se lhe atira uma pedra
Todo círculo está fadado a se expandir e se desfazer
Que nenhuma mudança se pretenda permanente

Que nenhuma lei se pretenda imutável
E mudanças sutis e amorosas componham o palco terno de uma vida libertária 

Em comunhão com o Sol e as estrelas
Em atino com o relógio do corpo
Com as estações caóticas do inconsciente
Com a força não represada do instinto
Com a saliência de uma razão que não se pretende o único farol
Com o poder inquebrantável da comunhão
Amem


SKELTER - 6-11-2006

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