quinta-feira, 3 de outubro de 2013

SE ESTOU DEPRIMIDO

Hoje eu sou aquele inseto de carapaça pra baixo
Agitando as pernas, perdido
Tendo uma crise de pânico por não suportar mais o peso da cama

Os conselhos são inúteis
As mulheres passam por mim sem me ver
Como se eu não fosse um homem

Os colegas vão entender que estou deprimido
Mas nenhuma palavra dos outros vai me salvar
E ainda tem aquele que vai dizer que só seria digno meu sofrimento se eu estivesse vomitando tripas

Os remédios não vão adiantar
A família vai estar encardida nas suas sugestões

A TV vai continuar sendo uma péssima ferramenta pra passar o tempo
Os noticiários com suas desgraças vão ser ouvidos por um ouvido e saírem pro outro

A idéia de suicídio vai continuar pairando sobre minha cabeça
Aquela velha idéia de pular de um prédio no centro da cidade
O mais discreto possível, por favor
Mas eu vou ter medo de sofrer mais depois de morto
Baseado nos contos trágicos de espíritas e católicos
Não me deixam em paz nem nessa hora
Já temo tanto o aquém e ainda tenho de temer mais o além
Deus não é a favor da liberdade de expressão do suicida?
Deus é punitivo, é isso que ensinam

O psicólogo vai continuar tentando ser compreensivo
Mas já não há palavras que caibam nesse quadro negro
E toda memória está corrompida de preguiça e confusão e talvez maconha

O serviço do CVV vai agradecer minha presença e vai me deixar após algumas perguntas
Tão nu e cru com meus problemas quanto eu estava antes

Não há fazenda pra me recuperar
Não há retiro espiritual
Isso é se eu tivesse família com renda

Pobre deprimido
Poderia tomar o remédio caro que o amigo toma pra sua depressão
Com componente de anfetamina
Que faz acordar se sentindo animado
Mas eu fico tomando uma pilha de remédios inúteis

Mas não
Essa é mais uma edição da minha depressão
Não seja bem vindo ao meu pesadelo
Eu fico mudo, fico calado
Fico impotente
Fica à mercê que o tempo cure as coisas

E não adianta mandar currículos pra trabalhar
Ninguém me contrata

E não adianta ver palestras sobre meditação
A técnica parece simples
Mas é difícil por em prática 

E não adianta o facebook pra passar o tempo
Só há conversas rasas ali com meia dúzia de gatos pingados
E eu desaprendo a conversar quando estou deprimido
Só digo “olá”, “como vai¿”
O resto é o vácuo do meu vazio

Quando eu estou deprimido
Não me consulte para uma opinião sobre o mundo ou sobre a arte
Não tenho mais conclusões acerca de nada
Nem da minha depressão
Nem do bem ou do mal
Nunca fui formador de opinião quando eu queria
E agora já não tenho nenhuma a dar

Essa é a terra de ninguém
Essa é a terra de gigantes
Os gigantes são os adultos
São os que sabem trabalhar com alguma coisa
São os que têm opiniões e discutem de forma fluída sobre qualquer coisa
São os que vivem cercados de amigos no bar
As mulheres são objetos para serem contemplados à distância de um perfume
Que ela deixa no ar
Terra de gigantes
Todos têm opiniões
Todos têm um caminho a seguir
E todos têm um amor de vez em quando
Todo mundo tem
Eu tenho a minha dor
Que não me dá trégua à consciência dia e noite
Martelando o que fazer com tão pouco
Abrir aquela biografia de um rock star na página 300 e ler mais um pouco e voltar pra cama
Ficando deitado
Esperando acordar no País das Maravilhas
Ou nunca mais acordar

De mil projetos e utopias se compôs minha vida
Estilhaços na minha mente
Memória
Olha que ironia
Quem imaginava que fosse voar tão longe
Hoje tem preguiça de escovar os dentes
Preguiça de comer
Preguiça de tirar as lentes
Preguiça de fazer a barba
Preguiça de dar um testamento
Aquele que quando eufórico
Se sentia prenhe de críticas mordazes ao mundo e às pessoas
E hoje se vê com os poucos amigos que ele não matou em sua mania
Mas não faz tanta diferença agora não
Nunca fez muita diferença minhas amizades
E agora não tenho nada a dizer a elas