O dia em que João não suicidou
Nem por isso lhe deserdou
o tremor nas mãos
E na cabeça
Nem por isso sua consciência
decidiu lhe dar uma trégua
Nem por isso o dia deixou de amanhecer
como as dores de um parto
Nem por isso o tempo deixou de correr
como em galopada
Nem por isso as empresas
deixaram de rejeitar seu currículo
Nem por isso ele deixou de ficar perplexo
ao ver tantas pessoas tristes dizerem “bom dia”, “tudo bem”
“bom dia”, “tudo bem”
“bom dia, “tudo bem”
A taxa de criminalidade continuou aumentando
e os parlamentares a aumentar seus salários
A iminência de uma Bomba
ameaçando sua cabeça
Continuou a se sentir rejeitado
pelo sexo oposto
Suas asas insistiram em não reconhecer
os comandos de seu dono
Seus amigos continuaram a debandar
para o lado da onça
Sua timidez continuou a escalar o muro
olhando para baixo
Seu medo e seu desânimo continuaram
como um vírus ou um câncer
continuaram como um vírus ou um câncer
Os fios de seu cabelo continuaram a quebrar
como numa procissão frenética
E a embranquecer
Suas dívidas e prestações com Deus, o Homem e o Diabo
continuaram seus juros
A orquestra desafinada de vozes,
na sua cabeça, não se calou
Sua percepção de que Deus o ironizava
nos pequenos e grandes detalhes
nos pequenos
Nem por isso ele deixou de ficar perplexo
ao ver tantas pessoas tristes dizerem “bom dia”, “tudo bem”
“bom dia”, “tudo bem”
“bom dia”, “tudo bem”
Seus olhos continuaram esbugalhados
como um animal prestes ao abate
Todos os seus distúrbios psicossomáticos
Em estado de vigília
Seu desejo de convocar o carrasco,
não para lhe torturar mais como agora,
Mas para pôr logo sua cabeça na guilhotina
Mas esse é o dia em que João não suicidou
E cumprimentado
Ele respondeu “bom dia” e “tudo bem”
“bom dia” e “tudo bem”
“bom dia” e “tudo bem”
2 outubro 2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário